O QUE SIGNIFICA?
Ayurveda quer dizer “conhecimento ou ciência (veda) da longevidade (ayur). Falar historicamente das fontes do Ayurveda é um trabalho muito difícil. A cultura indiana da língua sânscrito surpreendentemente preservou muitos textos antigos pela tradição de conhecimento oral, passada de mestre para discípulo, pois a escrita só passou a ser importante como transmissão de conhecimento no período do rei Açoka, imperador indiano da dinastia Máuria que reinou entre 273 e 232 a.C..
Embora tenhamos um rico e extenso material disponível para pesquisa, temos também buracos importantes que nos impedem de montar de forma adequada esse quebra cabeça de aproximadamente cinco mil anos de história. Porém é consenso entre os vários autores que algumas práticas médicas estiveram presente durante todo o desenvolvimento da cultura indiana, desde os mais remotos tempos e que essas ideias foram se organizando e tornando o Ayurveda um corpo de doutrina unificado e organizado já por volta do século V a.C., quando alguns textos de tradição acadêmica e familiar começaram a ser produzidos.
HISTÓRIA
Se historicamente é difícil localizar o Ayurveda em todas as suas raízes, certamente delimitar seu alcance é tarefa mais fácil. Inicialmente sua influência foi marcante em todo o subcontinente indiano, mas acabou se disseminando para regiões vizinhas e distantes. Muito dessa expansão se credita às rotas de comércio em que a Índia tinha um papel central, por ser grande produtora de especiarias, produtos agrícolas e seda. Exatamente pela riqueza de produtos e pelas terras extremamente férteis em virtude de seus caudalosos rios, a Índia sempre atraiu o interesse de povos vizinhos, o que explica as constantes invasões do seu território de povos oriundos de todas as direções, como persas, gregos, até o séc. III a.C., mongóis no início da nossa era, hunos eftalitas, por volta do século VI e árabes, entre os séculos VII e X da nossa era. Embora se saiba que todo contato entre povos diferentes determine trocas culturais importantes, a relação entre a cultura grega e a indiana parece ter sido a mais rica.
Relatos desse contato já eram descritos alguns séculos antes, mas uma das mais importantes campanhas de invasão do território indiano pelos gregos, com influência culturais bilaterais foi a ocupação de Alexandre da Macedônia, no século IV a.C. Alexandre “O Grande” tinha como característica respeitar a cultura e a religião dos povos dominados o que, em território indiano, favoreceu uma ampla miscigenação cultural em várias áreas do saber como na matemática, na astronomia, na filosofia, na construção e sobretudo na medicina. Há relatos que em alguns antigos reinos indianos, transformados em satrapias gregas pela invasão da Índia, soldados gregos picados por serpentes, deveriam ser tratados exclusivamente por médicos do Ayurveda, pela excelência e eficiência dos seus antídotos contra vários venenos, inclusive os de animais peçonhentos.
É possível que dois séculos antes de Alexandre, Hipócrates já tivesse estado em território indiano. Um grande ponto em comum entre as medicinas grega e indiana é sua base na teoria dos humores, defendida na Grécia, por Hipócrates e Galeno, na determinação das constituições dos vários indivíduos e suas tendências às mais variadas doenças físicas e mentais. Hipócrates também defendia seus conhecimentos em saúde no caminho de métodos terapêuticos reprodutíveis e baseados em evidências de resultados comprovados, a exemplo do que faziam também, os grandes autores do Ayurveda antigo.
Além das invasões, outro fator que determinou a disseminação do Ayurveda por fatores intrínsecos ao próprio cenário indiano foi a migração de monges budistas, por volta do século V a.C. para reinos vizinhos e distantes, perseguidos por razões políticas e religiosas em território indiano. Levavam consigo, além do conhecimento religioso, técnicas de tratamento médico do Ayurveda.
SISTEMA DE MEDICINA
AS PRÁTICAS MÍSTICAS E A CIÊNCIA MÉDICA
As práticas místicas sempre foram comuns na Índia, cultura famosa pelos seus laços com valores espirituais, como aqueles encontrados nas práticas psicofísicas do Yoga e no Hinduísmo com seus trezentos e cinquenta milhões de divindades. Esses traços são largamente encontrados nos antigos textos litúrgicos dos Vedas (Rig, Sama, Yajur e Atharvaveda), coleções e extensas obras de hinos religiosos que norteiam as práticas do Hinduísmo. A maioria dos historiadores do Ayurveda concorda que essa mística exerceu forte influência no pensamento médico indiano, sobretudo através do Atharvaveda que além de práticas de encantamentos e tratamentos por métodos místicos já descrevia com detalhes plantas e metais de uso medicinal. Todavia, existem diferenças significativas, tanto no conteúdo como no estilo literário, entre o Atharvaveda e os primeiros textos do Ayurveda que se aproximam mais da linguagem médica de tradições como a grega e a persa, em que as influências religiosas eram muito menores.Embora o misticismo com práticas rituais fosse rejeitado pela medicina indiana clássica, a espiritualidade como parte inseparável da compreensão do homem era fortemente defendida. Isso se comprova sobretudo pela concepção de homem e pela definição de saúde e de doença encontrada nos diversos textos do Ayurveda. Assim, o Caraka Samhita, um dos mais respeitados e antigos textos clássicos de Ayurveda, define vida (ayus) como “a perfeita conjunção entre o corpo, os órgãos dos sentidos, a mente e a consciência”.Assim, o homem só pode ser totalmente compreendido e considerado na plenitude de sua vida se estiverem em harmonia a sua dimensão física (corpo físico), mental (corpo sensorial e mental) e espiritual (corpo do intelecto e da Consciência). A palavra espiritualidade é extremamente perigosa por enfeixar uma larga gama de sentidos semânticos que podem não corresponder exatamente às possibilidades de compreensão pretendida pelos textos do Ayurveda.
Espiritualidade aqui deve ser compreendida como uma capacidade inerente ao homem de abstração e afastamento do mundo concreto, percebido pelos cinco sentidos, e a introspecção e busca de novas experiências percebidas nas inúmeras possibilidades de manifestações do psiquismo.
PRINCÍPIOS BÁSICOS DO AYURVEDA
O Ayurveda é um sistema médico apoiado numa história de aproximadamente cinco mil anos. Assim sendo, os vários princípios que norteiam as suas práticas passaram por um processo de evolução ao longo do tempo, decorrente do seu próprio desenvolvimento e da influência de outros sistemas de medicina tanto autóctones (siddha e unani medicine) como estrangeiros (medicinas grega, persa, chinesa). Uma antiga filosofia da Índia, o Samkhya Darçana , descrita num dos mais antigos textos de Ayurveda, o Susruta Samhita defende que o universo surgiu quando o Criador, saindo de um estado de profundo silêncio e meditação decidiu manifestar-se em múltiplos indivíduos. O processo que teria se originado com o rompimento do silêncio da Consciência Absoluta do Criador manifestou-se primariamente como Consciência Individual (vyakti, que significa “o que se manifesta”), no emanar do Seu desejo de se manifestar. Da consciência individual ou desejo de criação surgiu a inteligência pura, que reconhece o que deve ser criado, também chamado de Intelecto ou Mahat que em sânscrito literalmente significa o “o grande”. Assim que a inteligência pura determinou com precisão o plano da criação, surgem as mais variadas formas de existência em diferentes indivíduos, ou Egos pessoais, ahamkara na língua original, responsáveis pela memória e pelo instinto de sobrevivência de cada ser criado. A criação dessas múltiplas formas de existência tornou necessários também um aparelho de percepção (para que cada indivíduo criado pudesse perceber o restante da existência, além de si próprio) e também de órgãos com capacidade de ção (para que os indivíduo s pudessem interagir mutuamente).
Para a interação adequada entre o sentir e o agir, se fez necessário um centro de processamento que, recebendo as informações do aparelho de percepção, comandasse as ações adequadas para cada momento. Assim, os cinco sentidos são nossos órgãos de percepção(visão, audição, paladar, olfato e tato) e são chamados de Jñanendriya; os órgãos de ação, Karmendriya , representam a capacidade de atuação no mundo: comunicação, preensão, locomoção, reprodução e excreção; por fim, Manas ou mente pensante, literalmente, “a função de pensar”, recebe as informações dos cinco sentidos e decide a ação que melhor nos adapta ao meio a cada instante.
O Ayurveda acredita que toda a forma de existência, animada ou inanimada, é composta por uma Consciência Absoluta (a presença do Criador em cada criatura) ou corpo espiritual, pela Consciência Individual (fruto do desejo e que representa o papel de cada um na história da criação), pelo Intelecto (inteligência sem emoções com capacidade de discernimento entre o certo e o errado no cumprimento do papel individual de cada criatura), pelo Ego (memórias de experiências vividas em cada existência e instinto de sobrevivência), pela Mente Pensante (responsável pelas emoções, dúvidas, fantasias e desejos) que além de ser um órgão de interação entre as informações vindas dos órgãos dos sentidos também determina a ação adequada de adaptação às exigências do meio ambiente), pelos órgão dos sentidos (percepção dos cinco sentidos) e finalmente pelo corpo físico (responsável pelas ações).
Quando a relação entre todos esses elementos é harmônica e não há conflitos entre eles, desfrutamos um estado de plena saúde. Por outro lado, a desarmonia da relação de qualquer um desses componentes desencadeia as doenças. Com essas definições podemos entender o conceito de saúde encontrado no Caraka Samhita, corroborado pelos outros textos clássicos: “A aplicação feita incorretamente, em excesso e a não aplicação do tempo, da mente e dos objetos dos sentidos são a tripla propiciação da causa das doenças, tanto dos órgãos dos sentidos quanto da mente. O corpo e a mente dos seres são a sede das doenças bem como dos prazeres. O uso correto, então, é a causa dos prazeres”.
A DOUTRINA DOS TRÊS HUMORES E DOS CINCO ELEMENTOS
A doutrina dos três humores ou tridosha vidya nos ensina que as funções corporais e mentais são controladas pelos três humores principais: Vata ou Ar, que controla todos os movimentos internos e externos no corpo; Pitta ou Fogo, que promove todos os processos de transformação, sejam digestivos, enzimáticos ou hormonais e Kapha ou Shleshman, elemento Água, responsável pela lubrificação, nutrição e estruturação do corpo e da mente. Cada um desses humores, engloba um segundo elemento complementar, que compõe suas ações fisiológicas. Assim, Vata é composto dos elementos Ar e Espaço, Pitta, combina os elementos Fogo e um pouco do elemento Água, que o estabiliza para que o elemento Fogo não seja consumido por si próprio e Kapha, composto pela Água e pelo elemento Terra que lhe dá contenção.
Vata, aquele que põe toda a existência em movimento, além de movimentar os outros dois humores, Pitta e Kapha, permite à mente adaptar-se e compreender, animando nosso aparelho sensorial. Por ser composto dos elementos Espaço (vacuidade e aridez) e Ar (movimento) Vata é seco, leve, frio, áspero, sutil e agitado. Forma indivíduos que, quando saudáveis, apresentam entusiasmo, flexibilidade,
adaptabilidade, boa comunicação, criatividade e rapidez para aprender, pela mente viva e ativa que possuem.
Porém quando em excesso, promove facilidade para esquecer, ansiedade, inconstância, insegurança, indecisão, agitação, medo, estimula ações desonestas, depressão, perversões de todo tipo, levando os indivíduos Vata à dependência química e à autodestruição. Pela velocidade da vida moderna, encontramos atualmente um grande número de indivíduos com desorganização de Vata, o
princípio do movimento, com suas consequências mais comuns como o emagrecimento, debilidade, a insônia, a dificuldade de concentração, a constipação intestinal e as doenças degenerativas do sistema nervoso e do tecido
osteoarticular.
Pitta, o humor que “digere” e que transforma, é responsável por todas as mudanças mentais, metabólicas e químicas que ocorrem no corpo. Ele “ilumina” também nosso Intelecto nos permitindo compreender e perceber
com grande assertividade a realidade sem fantasias. Por ser composto de Fogo e Água, Pitta é levemente oleoso, agudo, quente, leve, de mau odor, móvel e líquido. Percepção, inteligência, inventividade, lógica, coragem e liderança são características de um Pitta equilibrado. Quando o elemento Fogo intensifica e se desajusta promove sensações de queimação e alterações na coloração da pele, da urina e das fezes que ficam de cor amarelo intenso. Também ocorre a irritabilidade, a ambição desmedida, a raiva, a crítica excessiva, a audácia, o orgulho, a dominação, a precipitação por excesso de confiança, a manipulação pelo
poder, a rigidez, o ódio, o desejo de vingança, a vaidade excessiva, o desejo de destruição, as psicopatias e algumas ações criminais, com destruição do outro. Ainda frequentes, mas menos numerosos que os indivíduos Vata as alterações
do elemento Fogo trazem doenças inflamatórias e febris, doenças hepáticas, sobretudo inflamatórias, doenças de pele, alterações hormonais, abscessos, problemas da visão e intolerâncias alimentares.
Kapha, o humor que mantém as coisas unidas (elemento Água) e que fornece o suporte para manifestação dos outros humores (elemento Terra), mantém nosso
emocional e sentimentos como amor, compaixão, paciência e perdão. As características dos elementos que compõem Kapha lhe conferem uma condição fria, úmida, pesada, pegajosa, macia, sólida e lenta. Quando os elementos Água
e Terra estão em equilíbrio e em proporções adequadas promovem estabilidade, calma, paz, compaixão, paciência, suavidade, receptividade, perdão, alegria, resistência, fé e amorosidade. Porém quando se desajustam e ultrapassam
os outros elementos provocam náuseas, sensação de peso, palidez, sonolência, calafrios, apego, cobiça, materialismo, sentimentalismo, luxúria, necessidade desmedida de segurança, lentidão, acomodação, apatia, depressão, rudeza,
letargia e tendência ao roubo, pela maior necessidade de segurança material. Os desequilíbrios dos elementos Água e Terra são os menos frequentes atualmente e
quando ocorrem provocam as doenças respiratórias, sobretudo alérgicas, sinusites, os edemas não inflamatórios, principalmente linfáticos, as deficiências imunológicas e as doenças de acúmulo como o diabetes, a hiperuricemia
e a hipercolesterolemia. A definição dos doshas, que embora estejam presentes em todos os tecidos corporais, ocupam preferencialmente determinadas regiões. Assim Vata se localiza principalmente no cólon, coxas, quadris, ossos, ouvidos e órgãos do tato. Pitta está no intestino delgado, estomago (área produtora de ácido), glândulas sudoríparas e sebáceas, no sangue e na visão. Kapha ocupa o peito,
nariz, garganta, cabeça, pâncreas, estomago (área produtora de muco), linfa, tecido gorduroso, nariz (olfato) e língua (paladar). Quando a doença se manifesta nos locais preferenciais de cada humor (dosha), considera-se que o quadro patológico é inicial e de mais fácil tratamento e o retorno à integridade da saúde é rápido. Porém, quando as manifestações de sintomas dos doshas ocorrem em órgão
fora do seu domínio, as doenças são mais graves e de mais difícil solução.
DIAGNÓSTICO
Se lembrarmos que exames laboratoriais não existiam, mesmo num passado recente, a observação detalhada de sintomas e sinais era de extrema importância
para um diagnóstico preciso e um tratamento eficiente. As formas corporais falam muito a respeito da constituição de um indivíduo. A irregularidade e inconstância nas formas, como por exemplo a implantação das orelhas em alturas diferentes de cada lado fala a favor da constituição Vata; ângulos bem definidos e simetria quase perfeita, fala a favor de Pitta; as formas arredondadas predominam em indivíduos Kapha. A coloração de secreções e da pele também pode definir um diagnóstico. A coloração escura e sem brilho é própria de Vata, amarelo e vermelho definem
Pitta e a palidez e a cor branca caracterizam Kapha. Temperatura e umidade também são parâmetros úteis como guias diagnósticos. Vata tem a pele fria e seca (elementos Espaço e Ar), Pitta (elementos Fogo e Água) tem a pele quente e úmida e Kapha (elementos Água e Terra) fria e úmida.
O comportamento também é resultado das forças dos elementos que movem a constituição. Indivíduos Vata, quando equilibrados, são ativos, adaptáveis, flexíveis e de rápida compreensão, entusiastas e bons em comunicação. Desequilibrados se tornam indecisos, hiperativos, ansiosos, loquazes, medrosos, depressivos, pervertidos e auto destrutivos. Indivíduos Pitta em equilíbriosão inteligentes, claros, perceptivos, independentes, corajosos, líderes e arrojados. Descompensados se tornam impulsivos, ambiciosos, agressivos, manipuladores, raivosos, orgulhosos, vingativos e destrutivos dos outros. Kapha determina, quando em equilíbrio, indivíduos calmos, pacíficos, alegres, estáveis, consistentes, leais, amorosos, compassivos, pacientes, devotados e com muita fé. Em estados de não compensação se mostram apegados, materialistas, sentimentais, inseguros, entorpecidos, apáticos, embotados, buscando conforto material excessivo
e a luxúria como válvula de escape de suas apreensões. A descrição pormenorizada dos sintomas também determina não só o elemento que se encontra em
desequilíbrio, mas também seu estágio de descompensação, a localização, os tecidos e canais envolvidos no desequilíbrio além dos prognósticos de cura com os tratamentos adequados.
A observação dos elementos de exoneração como as unhas, pelos, cabelos, informações sobre a transpiração, as evacuações de fezes e urina e nas mulheres da menstruação e do aleitamento podem dar importantes informações
diagnósticas. O exame da língua é de fundamental importância. A forma, a espessura, a umidade, o odor, a presença, a cor e a distribuição da saburra, alinhamento da linha central, presença da marca dos dentes nas bordas da língua e a observação de movimentos involuntários são fortemente indicativos de desequilíbrios. A saburra escura aponta desequilíbrios de Vata, a amarela de Pitta e a esbranquiçada e pegajosa é característica de Kapha. A presença de saburra
em diferentes áreas corresponde à representação dos vários órgãos do corpo nessas diferentes áreas da língua. O tremor involuntário da língua expõe um estado de ansiedade crônica, por desarranjo intenso de Vata (p.60-2).11
Porém, entre todos os exames, a exemplo do que ocorre também na medicina tradicional chinesa, o exame de pulso é o mais exato e mais reverenciado por todos
os grandes médicos do Ayurveda. O exame de pulso necessita de extrema concentração e boa sensibilidade tátil, para se perceber em qual dos três dedos utilizados no exame (indicador, médio e anular) a batida do pulso é mais fortemente percebida. A forma como sentimos a pulsação também tem muito a nos dizer. Os textos clássicos, sobretudo o Sarngadhara Samhita afirma que a
sensação do pulso Vata (pela inconstância do elemento Ar e vacuidade do elemento Espaço) é percebida como um pulso fraco semelhante a passagem de uma serpente ou de um verme no dedo indicador do examinador; Pitta, intenso pelo elemento fogo, produz um pulso agudo no dedo médio, como o salto de um sapo e a suavidade do elemento água e a estabilidade do elemento Terra produz um pulso cheio, mas suave como o deslizar de um cisne num lago, no dedo anelar. As sensações porém podem se apresentar fora do contexto de normalidade e uma grande variedade de padrões de pulso são descritos, determinando de forma precisa um grande número de doenças que devem ser tratadas. Só para se ter uma ideia da riqueza do exame de pulso, podemos identificar duzentas e dez informações ao examinar o pulso de um paciente. Sentimos o pulso em ambos os lados, percebendo a pulsação em cinco regiões de cada um dos três dedos utilizados no exame e em sete níveis de profundidade diferentes.
TRATAMENTOS
O ponto principal dos tratamentos em Ayurveda é restabelecer as funções adequadas dos doshas Vata, Pitta e Kapha. Para isso, a primeira coisa que se busca é entender os mecanismos físicos e mentais que levaram os indivíduos a alterarem essas funções e inicialmente corrigir a rotina diária (dinacharya) para impedir que novos produtos tóxicos (Ama) sejam formados. Na grande maioria dos casos isso
já é suficiente para a saúde ser restabelecida, sobretudo em indivíduos jovens e com quadros clínicos funcionais. Na rotina diária são incluídos novos hábitos, baseados em horários previamente determinados e que, segundo o Ayurveda, são os momentos em que cada órgão dispõe da sua maior concentração de energia para desempenho das suas funções. Só como exemplo, podemos citar a biodisponibilidade do aparelho digestório por volta do meio dia, pico da energia de Pitta, elemento Fogo, coincidindo com o ápice da posição do Sol no céu e que, em qualquer lugar do planeta, corresponde à hora do almoço. Assim cada conselho da rotina diária é baseado no predomínio de cada um dos cinco elementos nas vinte e quatro horas do dia. A identificação de desequilíbrios emocionais é sempre
valorizado pois emoções reprimidas são forte formadoras de toxinas (Ama). Uma das melhores maneiras de lidar com as emoções é aprender a observá-las quando elas se expressarem, focando a atenção não na emoção em si, mas nos mecanismos de desequilíbrio que elas desencadeiam. Com o hábito de observá-las, tornamos as emoções passíveis de serem superadas, sem necessariamente se
manifestarem. Cada dosha tem emoções predominantes em função dos elementos que o compõem. Assim, a ansiedade e o medo são mais comuns em indivíduos Vata; é comum para um Pitta sentir raiva e indignação; pacientes Kapha,
frequentemente expressam sua insegurança e sofrimento por apego e por perdas afetivas e materiais. Segundo o Ayurveda, o medo afeta os rins, a raiva desorganiza o fígado, o apego, agride o coração e avidez por valores materiais altera o baço. Quando apenas as rotinas de horários de alimentação, sono e atividade física não são suficientes para o restabelecimento seguro da saúde, procedimentos de neutralização de toxinas já profundamente instaladas em órgãos vitais são necessários.
Para esses casos, o Ayurveda indica o Panchakarma (cinco ações) que procura deslocar, remover e eliminar toxinas acumuladas por longos períodos de negligência aos cuidados com a saúde. Depois de uma preparaçãoprévia de uma a três semanas (purvakarma) com chás de ervas promotoras de desintoxicação, dieta hipotóxica a base de vegetais cozidos, ingestão de óleos (oleação interna), massagens com óleos medicinais (oleação externa) e banhos de vapor, inicia-se o Panchakarma propriamente dito. Nesse tratamento são descritos cinco terapias para remoção do excesso dos doshas Vata, Pitta e Kapha: Vamana, ou vômito terapêutico, em que é dado ao paciente três ou quatro copos de chá de cálamo aromático associado a outras ervas medicinais ou alcaçuz e após alguns minutos se provoca o vômito. Terapeuticamente está indicado para o excesso de Kapha e seus sintomas como a congestão brônquica, dos seios da face, para a tosse crônica, para a asma e também para o diabetes (acúmulo de açúcar no
sangue) na hipercolesterolemia, em obstruções linfáticas, edemas, digestão lenta e amidalites de repetição. Outros acúmulos de elementos Água e Terra, como as emoções de Kapha de apego e insegurança também encontram indicação
de vamanas. Outro procedimento incluído no Panchakarma é o uso de ervas purgativas, Virechana, para retirada do excesso de Pitta e suas toxinas do fígado, vesícula biliar e intestinos que provocam lesões inflamatórias da pele, rashes cutâneos, acne, dermatite, febre crônica, abscessos de glândulas sudoríparas, ascite, hemorroidas, gota e icterícia, além de outras doenças dos elementos Fogo
e Água (secundariamente). Um terceiro tratamento do Panchakarma são os enemas de ervas (Niruha) ou de óleos medicinais (anuvasana) introduzidos no reto, visando o tratamento do cólon em descompensações dos elementos
Espaço e Ar dos indivíduos Vata. São indicados para a constipação crônica, ciática, doenças reumáticas, artroses, atrofia muscular, desordens do sistema nervoso, cefaleias não pulsáteis (a pulsação é uma indicação de tratamentos
anti Pitta), cálculos renais e distúrbios sexuais. Como Vata é responsável por uma gama apreciável de patologias, os bastis são usados em tratamentos de inúmeras doenças.
Nasya é outro componente do Panchakarma e consiste na administração de medicações por via nasal. Está indicado no acúmulo de doshas na garganta, nariz, seios da face e cabeça por que o nariz é a abertura do corpo mais próxima para a saída de toxinas. As preparações medicinais podem ser administradas como pós para aspiração (virechana nasal), óleos de ação sedativa e nutritiva para Vata, decocções de ervas com as mais variadas indicações para sistema nervoso e massagens nasais para alívio de cefaleias agudas ou crônicas, rinites,
rouquidão, sinusites, linfadenites cervicais, vertigens, epilepsia (estados intercríticos), Parkinsonismo e alterações psíquicas relativas a Vata, Pitta e Kapha, já que o nariz, para o Ayurveda é considerado a porta de entrada para o
cérebro e para a consciência15. Como o nervo olfatório é relativamente superficial e liga a mucosa nasal ao sistema nervoso central, as massagens nasais são consideradas sedantes potentes de emoções bloqueadas. Nos períodos
de clima seco, a massagem interna das narinas com óleo de gergelim, traz imenso conforto e previne sangramentos. A quinta e última ação terapêutica do Panchakarma, as retiradas de sangue de áreas de congestão sanguínea (rakta
moksha) tem indicações sobretudo nas doenças Pitta, já que os elementos Fogo e Água controlam o sangue e o sistema circulatório. Assim, as doenças crônicas de pele, sobretudo as inflamatórias mas também os aumentos de baço e fígado, as varizes, as hemorroidas, as doenças inflamatórias articulares e a Gota encontram alívio com sangrias em áreas específicas. Convém ressaltar que são retiradas pequenas quantidades de sangue e em nada se compara às técnicas de sangria que se praticava na Idade Média que espoliavam os indivíduos que se submetiam a
elas e que frequentemente os levava à morte. Após aplicações de Panchakarma, o Ayurveda aconselha as medidas pós desintoxicação (uttara karma) com estimulantes de enzimas digestivas como as ervas quentes e pungentes como o gengibre e um pouco de sal, o limão, a pimenta preta, os chás de erva doce e raiz de bardana e sucos de lima da Pérsia ou de romã além de uma dieta leve
por mais alguns dias, o que complementa a desintoxicação. Além do Panchakarma, outras formas de tratamento também são indicados como o aconselhamento dietético específico para cada dosha, Vata, Pitta e Kapha, através de extensas
listas de alimentos específicos encontradas nos vários textos modernos de Ayurveda.
Lembrando que o Ayurveda teve também a escola cirúrgica de Sushruta, vários procedimentos cirúrgicos foram disponibilizados, tanto na reparação de tecidos lesados por acidentes ou batalhas, como também na excisão de tumores, no esvaziamento de ascite e na drenagem de abscessos que já eram realizados pelos cirurgiões do Ayurveda, segundo relatos de textos do século IV a.C. Além de vários instrumentos cirúrgicos, muitas técnicas de cirurgia do Ayurveda antigo são utilizadas até hoje com mínimas modificações. Surpreendente para a época em que foi descrito, o chamado “retalho indiano” é utilizado na cirurgia plástica dos dias de hoje, mais de dois mil anos depois que foi descrito. Essa técnica consiste em um retalho pediculado rodado da região frontal, para reconstrução de perda do
nariz. A reconstrução nasal era uma cirurgia comumente praticada numa época em que as batalhas de espada eram frequentes e também por que a pena para criminosos ou povos conquistados era a mutilação de alguma parte do corpo que os estigmatizasse, como a amputação do nariz, do lóbulo da orelha e até dos genitais. No ocidente, as técnicas cirúrgicas tiveram um grande período de estagnação, sobretudo por influência da igreja católica e até mesmo de religiões anteriores que proibiam a dissecção de cadáveres, considerada uma profanação. Na Europa isso só mudou após a liberação das dissecções pelo Papa Sixto V, em meados do século XVI e o retalho indiano só passou a ser descrito em livros de medicina ocidental, no “Magazine of Gentleman” publicado no século XVIII, dois séculos mais tarde, quando os procedimentos cirúrgicos no ocidente, passaram a sermais comuns.
Ainda como tratamento, lembramos a extensa farmacopeia indiana, com mais de dez mil plantas estudadas, algumas inclusive utilizadas no ocidente como fitoterápicos modernos. É importante citar também o estímulo dos vários pontos de energia e seus meridianos, assemelhados à medicina chinesa, que oferecem um recurso a mais de tratamento, seja pela aplicações de agulhas (acupuntura)20,
como também pelo uso de óleos medicinais ou acupressão em massagens (marmaterapia).
Mesmo derivadas da mesma origem, o Ayurveda e o Yoga caminharam na antiguidade por caminhos separados, embora citados mutuamente em seus textos mais antigos. Só recentemente encontramos tratamentos em livros de
Ayurveda que incluem práticas de posturas físicas, exercícios de respiração e meditação e relatos de procedimentos de Ayurveda incluídos em conselhos para praticantes de Yoga, como forma de facilitar o caminho de desenvolvimento
espiritual. Temos certeza que esses conhecimentos milenares do Ayurveda, testados por várias gerações por aproximadamente cinco mil anos de história, teriam muito a contribuir com a medicina ocidental, desde que fossem vistos não como uma forma de conhecimento excêntrico, mas como uma arte na observação dos fenômenos físicos e psíquicos, com sua descrição detalhada de sinais e sintomas, tanto dos pródromos como dos sintomas mais avançados de uma doença. Também merecem estudos a extensa gama de recursos terapêuticos direcionados não apenas para cada estágio de desenvolvimento da doença, mas sobretudo pelo seu principal intuito, o de preservar a saúde e prevenir as
doenças.
MANIPURA
Sabia que o nome MANIPURA é um nome em Sânscrito? É um Chakra, do PLEXO SOLAR, e está ligado ao poder pessoal. A origem da teoria dos Chakras é da Medicina Ayurvédica.
FITOTERAPIA
A Manipura Farmácia disponibiliza alguns fitoterápicos da medicina ayurvédica, como:
TRIPHALA
BRAHMI
SHATAWARI
ASHWAGHNDA
REFERÊNCIAS
Deveza, A. C. (2013). Ayurveda: a medicina clássica indiana. Revista De Medicina, 92(3), 156-165. https://doi.org/10.11606/issn.1679-9836.v92i3p156-165
CARNEIRO, DANIEL MACIEL. AYURVEDA: Saúde e Longevidade na Tradição Milenar da Índia. São Paulo: Pensamento, 2009.
RANADE, SUBHASH; RANADE, SUNANDA. FISIOLOGIA AYURVÉDICA. Uberlândia: Fundação Sri Vájera.